O arsênio é conhecido desde a Antiguidade, muito antes de seu reconhecimento como elemento químico. Os compostos de arsênio, especialmente o sulfeto de arsênio amarelo (orpimento, As₂S₃) e o sulfeto de arsênio vermelho (realgar, As₄S₄), eram usados como pigmentos e venenos desde a época dos gregos e romanos. A palavra arsênio vem do grego arsenikon, que por sua vez deriva do persa zarnikh, que significa pigmento amarelo.
Na Idade Média, os alquimistas conheciam bem o arsênio na forma de trióxido de arsênio (As₂O₃), também chamado de arsênio branco. Em 1250, o sábio alemão Alberto Magno (1200-1280) foi o primeiro a isolar o arsênio metálico aquecendo trióxido de arsênio com sabão. Este método de redução permitia obter o elemento em sua forma elementar.
No entanto, foi o químico sueco Carl Wilhelm Scheele (1742-1786) quem, em 1775, demonstrou que o arsênio era um verdadeiro elemento químico e não um composto. Ele estabeleceu sua natureza elementar estudando suas propriedades e reações químicas. O arsênio foi oficialmente reconhecido como elemento no final do século XVIII.
A história do arsênio está intimamente ligada ao envenenamento criminoso. Durante os séculos XVII e XVIII, o trióxido de arsênio, inodoro e insípido, foi amplamente utilizado como veneno, a ponto de ser apelidado de pó de sucessão em referência às heranças que permitia acelerar. O desenvolvimento do teste de Marsh em 1836 pelo químico britânico James Marsh finalmente permitiu detectar a presença de arsênio nos tecidos biológicos, revolucionando a medicina forense.
O arsênio (símbolo As, número atômico 33) é um metalóide do grupo 15 da tabela periódica. Seu átomo possui 33 prótons, geralmente 42 nêutrons (para o isótopo mais abundante \(\,^{75}\mathrm{As}\)) e 33 elétrons com a configuração eletrônica [Ar] 3d¹⁰ 4s² 4p³.
O arsênio apresenta várias formas alotrópicas, sendo a mais estável o arsênio cinza (forma α), um sólido metálico brilhante de cor cinza-aço. Esta forma tem uma estrutura cristalina romboédrica com uma densidade de 5,73 g/cm³. O arsênio cinza é um semicondutor que se torna supercondutor a temperaturas muito baixas.
Também existe o arsênio amarelo (forma γ), uma forma molecular instável composta por moléculas tetraédricas As₄, semelhante ao fósforo branco. Esta forma, obtida por condensação rápida de vapor de arsênio, é extremamente reativa e se transforma espontaneamente em arsênio cinza à temperatura ambiente.
O arsênio preto (forma β), obtido por sublimação lenta do arsênio cinza, possui uma estrutura amorfa e está entre as formas amarela e cinza em termos de reatividade.
O arsênio não funde à pressão atmosférica, mas sublima diretamente a 615 °C (888 K), passando do estado sólido para o gasoso sem passar pelo estado líquido. Sob alta pressão (cerca de 28 atm), o arsênio pode fundir a 817 °C. Esta propriedade de sublimação foi historicamente utilizada para purificar o arsênio.
Ponto de sublimação do arsênio: 888 K (615 °C) à pressão atmosférica.
Ponto de fusão do arsênio: 1.090 K (817 °C) a 28 atmosferas.
| Isótopo / Notação | Prótons (Z) | Nêutrons (N) | Massa atômica (u) | Abundância natural | Meia-vida / Estabilidade | Decaimento / Observações |
|---|---|---|---|---|---|---|
| Arsênio-75 — \(\,^{75}\mathrm{As}\,\) | 33 | 42 | 74.921595 u | 100 % | Estável | Único isótopo estável do arsênio. Possui um momento magnético nuclear utilizado em RMN. |
| Arsênio-73 — \(\,^{73}\mathrm{As}\,\) | 33 | 40 | 72.923825 u | Sintético | ≈ 80,3 dias | Radioativo (captura eletrônica). Utilizado em pesquisa biomédica como traçador. |
| Arsênio-74 — \(\,^{74}\mathrm{As}\,\) | 33 | 41 | 73.923929 u | Sintético | ≈ 17,8 dias | Radioativo (β⁺, captura eletrônica). Emissor de pósitrons utilizado em PET para imagem médica. |
| Arsênio-76 — \(\,^{76}\mathrm{As}\,\) | 33 | 43 | 75.922394 u | Sintético | ≈ 26,3 horas | Radioativo (β⁻). Produzido em reatores nucleares, utilizado em pesquisa. |
| Arsênio-77 — \(\,^{77}\mathrm{As}\,\) | 33 | 44 | 76.920648 u | Sintético | ≈ 38,8 horas | Radioativo (β⁻). Utilizado em radioterapia direcionada e como traçador em agronomia. |
N.B. :
Camadas eletrônicas: Como os elétrons estão organizados ao redor do núcleo.
O arsênio possui 33 elétrons distribuídos em quatro camadas eletrônicas. Sua configuração eletrônica completa é: 1s² 2s² 2p⁶ 3s² 3p⁶ 3d¹⁰ 4s² 4p³, ou de maneira simplificada: [Ar] 3d¹⁰ 4s² 4p³. Esta configuração também pode ser escrita como: K(2) L(8) M(18) N(5).
Camada K (n=1): contém 2 elétrons na subcamada 1s. Esta camada interna está completa e é muito estável.
Camada L (n=2): contém 8 elétrons distribuídos em 2s² 2p⁶. Esta camada também está completa, formando uma configuração de gás nobre (neônio).
Camada M (n=3): contém 18 elétrons distribuídos em 3s² 3p⁶ 3d¹⁰. A presença da subcamada 3d completa é característica dos elementos pós-transição e influencia significativamente as propriedades do arsênio.
Camada N (n=4): contém 5 elétrons distribuídos em 4s² 4p³. Estes cinco elétrons são os elétrons de valência do arsênio.
Os 5 elétrons da camada externa (4s² 4p³) são os elétrons de valência do arsênio. Esta configuração explica suas variadas propriedades químicas:
O estado de oxidação mais comum do arsênio é +3, onde ele perde seus três elétrons 4p³ para formar o íon As³⁺. Esta configuração [Ar] 3d¹⁰ 4s² apresenta o par de elétrons 4s² inerte (efeito do par inerte). Os compostos de arsênio(III) incluem o trióxido de arsênio (As₂O₃) e o tricloreto de arsênio (AsCl₃).
O estado de oxidação +5 também é importante, onde o arsênio perde todos os seus elétrons de valência para formar As⁵⁺ com a configuração [Ar] 3d¹⁰. Os compostos de arsênio(V) incluem o ácido arsênico (H₃AsO₄) e o pentóxido de arsênio (As₂O₅). Este estado é menos estável que o +3 e tem propriedades oxidantes.
Existem também estados de oxidação negativos: -3 nos arsenietos metálicos como GaAs (arsenieto de gálio), onde o arsênio ganha três elétrons para completar sua camada de valência, formando As³⁻ com a configuração [Ar] 3d¹⁰ 4s² 4p⁶.
O arsênio também pode apresentar estados de oxidação 0 (arsênio metálico), +1 e +2, embora estes últimos sejam raros e instáveis. A química do arsênio é dominada pelas formas +3 e +5, refletindo a estabilidade do par inerte 4s² e a possibilidade de utilizar todos os elétrons de valência.
O arsênio cinza é relativamente estável no ar à temperatura ambiente, formando lentamente uma fina camada de óxido que o protege de maior oxidação. Esta passivação lhe confere uma resistência moderada à corrosão atmosférica. No entanto, o arsênio amarelo é extremamente reativo e oxida espontaneamente no ar, produzindo luz (quimioluminescência).
Em altas temperaturas, o arsênio queima no oxigênio com uma chama azul-pálida, formando trióxido de arsênio (As₂O₃), que se desprende como fumaça branca característica: 4As + 3O₂ → 2As₂O₃. Esta reação emite um odor típico de alho, devido aos compostos voláteis de arsênio.
O arsênio reage com ácidos oxidantes para formar compostos de arsênio(III) ou (V). Com ácido nítrico concentrado, forma ácido arsênico: As + 5HNO₃ → H₃AsO₄ + 5NO₂ + H₂O. O arsênio é relativamente resistente a ácidos não oxidantes diluídos, mas reage lentamente com ácido clorídrico concentrado.
Com bases fortes, o arsênio se dissolve para formar arseniatos ou arsenitos, dependendo das condições: 2As + 6NaOH + 3O₂ → 2Na₃AsO₄ + 3H₂O (formação de arseniato) ou 2As + 6NaOH → 2Na₃AsO₃ + 3H₂ (na ausência de oxigênio, formação de arsenito).
O arsênio reage diretamente com a maioria dos halogênios para formar tri-haletos (AsX₃) ou penta-haletos (AsX₅): 2As + 3X₂ → 2AsX₃ (onde X = F, Cl, Br, I). O trifluoreto (AsF₃) e o pentafluoreto (AsF₅) são particularmente estáveis.
O arsênio também forma compostos com metais (arsenietos) e com hidrogênio. A arsina (AsH₃) é um gás extremamente tóxico, ainda mais perigoso que o arsênio elementar. É utilizada na indústria de semicondutores para dopagem e fabricação de compostos III-V.
O arsênio é sintetizado nas estrelas por vários processos de nucleossíntese. Ele se forma principalmente durante a queima explosiva do silício em supernovas do tipo II, bem como por processos de captura neutrônica lenta (processo s) em estrelas da ramificação assintótica das gigantes (AGB) e pelo processo de captura neutrônica rápida (processo r) durante eventos cataclísmicos.
O único isótopo estável do arsênio (\(\,^{75}\mathrm{As}\)) é produzido por esses mecanismos e disperso no meio interestelar durante as explosões estelares. A abundância de arsênio em meteoritos primitivos fornece informações sobre as condições de nucleossíntese no sistema solar primordial e sobre os processos de formação planetária.
A abundância cósmica do arsênio é muito baixa, cerca de 8×10⁻¹⁰ vezes a do hidrogênio em número de átomos. Esta raridade reflete as dificuldades de síntese de núcleos nesta região de massa atômica (A ≈ 75) e o fato de que o arsênio possui um número ímpar de prótons e nêutrons, o que o torna menos estável que seus vizinhos pares.
As linhas espectrais do arsênio ionizado (As II, As III) foram detectadas nos espectros de certas estrelas quentes e objetos estelares particulares, como estrelas quimicamente peculiares. O estudo dessas linhas ajuda a entender o enriquecimento químico estelar e a evolução química das galáxias.
O arsênio também desempenha um papel potencial na astrobiologia. Algumas bactérias terrestres podem utilizar o arsênio em seu metabolismo, seja reduzindo o arseniato (As⁵⁺) a arsenito (As³⁺) para obter energia, ou incorporando o arsênio em biomoléculas. Essa capacidade levantou questões sobre a possibilidade de formas de vida baseadas em arsênio, em vez de fósforo, em ambientes extraterrestres ricos em arsênio.
N.B. :
O arsênio está presente na crosta terrestre a uma concentração média de aproximadamente 0,00018% em massa (1,8 ppm), o que o torna um elemento relativamente raro. Ele não forma minérios próprios, mas é encontrado associado a outros elementos, principalmente em sulfetos metálicos como a arsenopirita (FeAsS), o realgar (As₄S₄), o orpimento (As₂S₃) e em minérios de cobre, chumbo e ouro.
O arsênio é extraído principalmente como subproduto do processamento de minérios de cobre e chumbo. A produção mundial de arsênio é de cerca de 33.000 toneladas por ano, principalmente na China (≈ 65%), Marrocos, Rússia e Chile. O arsênio é geralmente comercializado na forma de trióxido de arsênio branco.
Devido à sua alta toxicidade, o uso do arsênio é estritamente regulamentado na maioria dos países. As normas da OMS limitam a concentração de arsênio na água potável a 10 μg/L (10 partes por bilhão). A exposição crônica ao arsênio pode causar sérios problemas de saúde, incluindo cânceres de pele, pulmão e bexiga, bem como doenças cardiovasculares e neurológicas.
O envenenamento por arsênio continua sendo um grande problema de saúde pública em certas regiões do mundo, especialmente em Bangladesh e na Índia, onde as águas subterrâneas contêm naturalmente altos níveis de arsênio. Milhões de pessoas estão expostas a essa contaminação natural, o que representa uma das maiores catástrofes sanitárias ambientais da história moderna.